top of page

Qual a melhor carne suína para Charcutaria

Atualizado: 12 de jul. de 2023

Existe uma carne ideal para Charcuterie ?

A resposta é sim, existe. Mas antes de falar sobre matéria-prima de qualidade preciso dizer um pouco do que penso sobre a produção agrícola que na minha opinião é o embrião de qualquer atitude gastronômica. Por mais que tenha havido uma ruptura nas ultimas décadas - até a década de 50 haviam carroceiros entregadores de leite na rua augusta em sp, então a proximidade com o produtor rural era maior e essa cadeia não havia sido rompida, atualmente mesmo que essa corrente tenha sido quebrada ainda existe uma ligação direta do produtor com o consumidor ou cozinheiro, só que essas pessoas não se conhecem mais, conhecem apenas os rótulos, e isso adoeceu a sociedade com alimentação pobre, eu me sinto uma pessoa mais completa quando ainda hoje tenho contato com a terra e me sinto muito feliz com isso. Mas eu sei que essa reinserção no sistema de produção a partir da profissão de cozinheiro ficou perdida, hoje é tudo na caixinha, no plástico, no mercado, sem saber o que realmente estamos comendo.


As grandes transformações na minha opinião não acontecem na sociedade, mas no indivíduo, então o indivíduo é a célula transformadora do mundo pra todos os caminhos, isso é parte de uma ação individual íntima, não é uma ação coletiva, é a sua consciência em relação aos resíduos e substratos que você produz. Agora, é claro que existem muitas formas de influenciar coletivamente uma sociedade, mas primeiro é consigo mesmo, com seu corpo, com sua vida, e depois com o coletivo, ai temos um processo de multiplicação, a família tem esse poder, a amizade tem esse poder, as relações de trabalho, e assim por diante. Hoje tenho a impressão que está parecendo cada vez mais básico entender as origens das coisas, por exemplo querer entender como esse salame chegou no mercado, e os cozinheiros parecem que estão tentando se reconectar, mas isso é uma onda crescente porque existe a necessidade de reconexão, as pessoas trazem um vazio dentro de si, e como preencher esse vazio é a questão a se pensar, esse caminho de estar do lado do comensal do restaurante que se preocupa de onde tá vindo o alimento ou aquele ingrediente, a consciência da necessidade do consumo local (ajudando o baixo rastro de carbono), isso está ai de muitas formas, em muitos casos a coisa é até muito plástica, envolvida com essa ou aquela ideologia, inclusive ao discurso de uma tendencia politica, outras vezes está ai também como forma de modismo, e as pessoas querem se colocar na sociedade com uma roupagem moderninha e descolada, portanto ela só come local e orgânico e tal, então tem esse viés de moda e status, mas eu acho que por ser uma onda é inevitável, e de certa forma até um pouco saudável porque em algum momento deverá se ter uma peneira natural, o crivo do tempo sobre todas as coisas deve trazer algum saldo positivo.


ree


O que um produtor artesanal pode fazer, seja ele de algum insumo cárneo ou não, ninguém mais pode oferecer, porque a artesania está impregnada de humanidade que é irreprodutível em série absoluta com produtos idênticos. Então essa identidade é uma das coisas que faz a grande diferença, e digo mais, nos próximos anos o seu espaço será ampliado, porque as pessoas estão requisitando esse valor novamente, que nada mais é o valor que o próprio mercado acabou dando para os produtos de luxo, ou da alta gastronomia, por exemplo a caneta Mont Blanc ou a faca Laguiole, uma coisa exclusiva, então o artesanato é luxo porque é exclusivo, essa necessidade tem muito a ver com esse momento que a humanidade vive onde o indivíduo quer ser único, me parece que a tempos atrás, nos anos 80 anos as pessoas queriam pertencer a um determinado grupo, hoje não mais, estar junto daquelas pessoas, agir de uma determinada forma, hoje o mundo é individualista onde o indivíduo é valorizado como nunca foi antes, então essa exclusividade que o produto artesanal trás, contempla esse anseio, o ser humano precisa encontrar valor em tudo que faz, nós não fazemos nada como os animais, impregnamos nossas atitudes com rituais.



ree


Mas como fazer para transmitir toda essa cadeia de produção se na verdade só existe o rótulo pra se comunicar com o consumidor final?

É bem complicado, mas tento aqui expor as nuances do imaginário da cultura caipira, o ABATE é natural e eu acredito que comer carne é algo virtuoso desde que seja feita de forma responsável e consciente, para que seja dessa forma é preciso ter consciência de que todo consumo de carne envolve um sacrifício, e sacrifício significa etimologicamente matar aquilo que é sagrado, e a vida é sagrada, eu entendo que o hábito de comer carne está ligado diretamente a composição de quem nos somos evolutivamente, mas acredito que sobremaneira um ato virtuoso, edificante, toda carne vem de um animal e esse animal precisou nos dar a vida e pra quem realmente conhece a cadeia produtiva de carnes sabe que isso é complicado, pois temos a questão do bem estar animal que nos impacta diretamente e profundamente bem como o abate consciente (humanizado), bem feito em termos de técnica, eu sou testemunha de que um abate feito com técnica é mais do que indolor, ele é imperceptível, é feito num ambiente mais natural possível, com o animal relaxado, comendo, numa situação que ele já foi exposto muitas vezes, então não é levado pra um lugar onde todos vão entrando um atrás do outro, ele tá relaxado em um ambiente que ele conhece e nesse momento ele é atordoado e o seu cérebro é instantaneamente neutralizado deixando de existir em termos de consciência e depois é feito todo trabalho.



ree


Agora, na outra ponta está a indústria que precisa de uma solução pra isso, em tese há uma solução pra um abate industrial, as boas práticas de abate de frigoríficos são incríveis, inclusive eu aprendo demais com isso, com livros, com tratados, com estudos - mas acontece que a gente sabe que se a questão sanitária não é seguida a risca como deveria, nós vimos recentemente escândalos envolvendo certificação aqui no Brasil, então se isso que envolve a vida do ser humano é assim, como será a questão do abate consciente? É ai que reside o problema. Nego crítica incêndio da Amazônia mas come seu bife daquela marca, então está ai toda incoerência e hipocrisia social. Já o manejo consciente do animal, faz toda a diferença na qualidade produtiva, isso é notável porque poucas pessoas falam sobre isso, por exemplo, um tempo atrás a gente estava na fazenda e minha mãe aos 79 anos estava tomando uma caneca de leite e falou; - filho, esse leite está com gosto de garapa, gosto de cana de açúcar, pois é, as vacas estavam sendo alimentadas com cana por um curto período de remanejo do capim, e minha mãe sentiu na hora o sabor. É um exemplo simples mas que representa o quanto o manejo e a alimentação estão diretamente ligadas ao sabor, aroma e qualidade final do produto.



Porco que come lixo tem gosto de lixo

Quando eu era criança me lembro do coletor de lavagem que depois virava esterco para lavoura em uma propriedade do meu pai, mas algumas pessoas criavam porco com aquilo, a lavagem era o alimento, é repugnante mas é a vida como ela é até hoje em muitos lugares, e tem um detalhe ai no meio que por mais chocante que possa parecer eu vou dizer, o ser humano também comeria isso se fosse confinado e privado do acesso de outros alimentos, com fome, então o porco é muito parecido com o ser humano em vários aspectos, a pele do porco por exemplo é usada para testes dermatológicos e muitas outras coisas, então quando o porco esta em um ambiente aberto ele tende a comer em um local, fazer suas necessidades em um outro local distante daquele ponto onde ele comeu e dormir num ponto equidistante entre os dois, mas se você obriga o porco a viver em um espaço tão restrito que ele não consegue fazer essa separação ele vai conviver com os próprios excrementos, assim como o ser humano também viveria, então a "atitude porca" imputada ao porco na verdade é uma maldade de quem faz o manejo, o porco é um animal essencialmente limpo, é um animal que precisa da lama por que ele não tem glândula sudorípara, ele pode morrer de calor facilmente, o animal precisa de água ou de lama, e quando ele não tem a lama pra não se queimar ou pra ele não sentir desconforto e até mesmo pra afastar os insetos da sua pele ele vai rolar nos próprios excrementos, e ai me vem o "ser humano" dizer que o porco é um animal sujo nojento, nojento é o ser humano que trata o animal dessa forma. O porco que come lavagem, é cabeçudo, orelha baixa, você enxerga tristeza no olho dele, vive de cabeça baixa, com deficiência de vitaminas, fica peludo, não forma músculo, o gosto da gordura é horrível.



ree

Outra coisa, o contato do porco com o solo é fundamental, porco é um animal fuçador, foi feito pra revirar o solo, e tudo isso leva o animal a uma condição melhor ou pior de sobrevida, a alimentação nem se fala, é primordial para o sabor final do seu produto, (não é uma "receita mágica" de um curso vagabundo ou de um grupo de Facebook que vai alterar isso, todo mundo gosta de falar como referência da Península Ibérica no sul da Espanha, que vem do tempo do império romano, onde tem o porco Ibérico, ou de Portugal que tem o porco preto Alentejano (Pata Negra), esses porcos são criados essencialmente livres nos campos, comem a famosa oleaginosa Bellota que faz uma conversão da gordura da carcaça deles de saturada pra insaturada, então o porco é saudável e o sabor acastanhado. Mas vou te contar uma coisa, pra você que vive no Brasil, um país de fácil manejo de pasto, pode parecer estranho, sabia que o porco embora não seja ruminante adora capim? Pois é, alguns porcos da nossa fazenda comem capim seco, soro de leite fresco, e um mix de grãos e esse não posso contar, mas incluem algumas castanhas e mais uns 15 tipos de grãos, com predominância para alguns desses grãos. E com isso a banha do meu porco é uma banha semi-liquida em temperatura ambiente, a estrutura dos ácidos graxos são convertidos pela alta ingestão de algumas oleaginosas. Mas é bom que se diga uma coisa, esse negócio de sentir cheiro disso ou daquilo depende apenas de uma coisa, da sua bagagem de experiências organolépticas, você não precisa ser um chef ou um sommelier pra isso. Alias tem muito chef por ai que fala pela bunda e não tem vivência alguma. Por exemplo a minha banha tostada tem cheiro e sabor acastanhado por conta do alimento que posso ofertar aos meus porcos. A questão sanitária também passa por um amadurecimento, por exemplo hoje a ANVISA já entendeu na questão do leite cru para fabricação de queijos que a maturação é mais importante que a pasteurização, então eu acredito que o universo do queijo está a frente da Charcuterie nesses termos, se hoje eu fosse abrir uma empresa e me profissionalizar eu montaria um laticínio e não uma Salumeria. O caminho está muito mais fácil para certificação. Já para os produtos cárneos existe um processo de adequação mas isso vai demorar no meu entendimento, seja em nível municipal, estadual ou federal. É um caminho que ainda esta sendo pavimentado e depende de muita vontade política e interesse de cada região.



ree


Normalmente a arte surge onde existe dificuldade, quando o ser humano está passando uma situação difícil ele tem que explorar a arte, porque a arte é aquilo que permite ele vislumbrar uma realidade que transcende a realidade que ele está, então comunidades que passam por uma escassez ou pobreza extrema ela precisa se apegar a arte porque a arte comunica e conecta a dor que eles estão passando com o mundo que eles gostariam de estar vivendo. Então, a final das contas como se faz um bom salame artesanal? É claro que a técnica aplicada na Charcuterie é importante, mas é mais simples do que todo esse aspecto da produção e da criação, por isso hoje eu me sinto um construtor de sabor, o que é muito diferente de ser um mestre ou um chef. limitado as paredes de uma cozinha. Só existe uma maneira de produzir embutidos de alta qualidade, usando matéria-prima de qualidade. A técnica você aprende estudando onde quiser, e o produto cárneo é o porco criado solto com boa alimentação, manejo e abate. Então, a parte técnica é a mais fácil na minha opinião porque o indivíduo só precisa estudar.


ree


Agora vamos falar sobre raças, genética e matéria-prima

Direto o ponto, tenha em mente que bom e barato não existe nesse universo da Charcuterie, o que existe é o ruim e caro.


Qual é o tipo de carne ideal para Charcuterie ?


É muito importante você visitar esse artigo - clique aqui.


A história recente da suinocultura brasileira tem uma predominância de raças caipiras no Brasil, começando pela década dos anos 50 e 60 até o começo dos anos 70 pelo porco preto que não tinha uma raça específica, por exemplo o Porco Piau ou o porco Sorocaba, eram animais tipo banha, até porque a banha era usada pra conservar a carne nas latas, e ai quando vieram as industrias de óleo com seu processamentos veio junto o assassinato de reputação da banha suína sendo rotulada como a geradora de todos os males da saúde humana o que fomentou e escalou a produção do óleo vegetal enriquecendo a industria e mudando a essência da carne suína.


A suinocultura mundial encontra-se em pleno processo de mudanças, principalmente em relação à produção de cárneos. Atualmente, a carne suína representa a fonte protéica animal mais consumida em todo o mundo, representando quase metade do consumo e da produção, com mais de 107 milhões de toneladas. No Brasil, apesar da carne suína ser menos consumida do que as demais, o país é o quinto maior consumidor, quarto maior exportador e produtor. O baixo consumo justifica-se pelo fato do país possuir uma grande extensão territorial, que permite produzir bovinos a baixo custo, o alto desenvolvimento da avicultura e sua diferenciação de cortes, os custos do produto ao consumidor e os preconceitos relacionados à carne suína.

A carne, no mundo moderno, é um item alimentar que constitui um critério essencial para a determinação da qualidade de vida de uma população. O aumento da demanda por proteína animal está exigindo aumentos na produção e na produtividade. Por outro lado, os consumidores estão cada vez mais exigentes com a qualidade do produto final fornecido.


Muitas pessoas ainda acreditam que a carne suína é aquela produzida em condições de pouca higiene, contendo alto teor de gorduras e colesterol, que poderia acarretar vários problemas de saúde da modernidade. Porém, hoje, a carne de suínos é decorrência da evolução tecnológica da indústria alimentícia, apresentando reduzido teor de gorduras, calorias e colesterol em relação há algumas décadas atrás. Fazendo uma analogia comparativa com peito de frango sem pele, o lombo suíno contém duas vezes mais zinco e 10 vezes mais tiamina numa porção, contém o menor teor de sódio de todas as carnes, e o maior teor de potássio, com baixo teor de gorduras saturadas e colesterol. O aumento expressivo no volume de carne produzida associado com o compromisso de atingir o mercado consumidor, modificou de forma marcante a tecnologia utilizada no processo de abate buscando melhora da qualidade das carcaças e da carne.


ree

Tenha em mente que o suíno é um animal onívoro, fuçador, portanto ele come de tudo o que colaborou com o sistema de criação antigo, desprovido de humanização e com regras sanitárias ausentes. Antigamente os criadores compravam os leitões de vários criadores em locais diferentes e faziam a engorda nas baias(não tinham as maternidades), e carregavam as doenças junto( questão sanitária problemática) era feita uma classificação por tamanho do porco, usando empirismo como critério técnico. Eu me lembro que o meu pai nos anos 80 teve que construir fabrica de ração na propriedade, o que permitiu ele fornecer sementes oleaginosas para os animais e verificar o impacto no sabor da carne e da gordura.


No Brasil, foi na década de 90 que se começou a falar sobre marmoreio, é muito recente. Começaram alguns cruzamentos com o Hampishare que é o porco faixa para avaliar também o sabor e ai se começou a falar mais sobre o Duroc que hoje está gourmetizado. Essa raça americana chamada Duroc Jersey com marmoreio (gordura entremeada), também tem um razoável acabamento de gordura subcutâneo, então com essa raça já é possível se resolver muita coisa quando usada pra fazer na grelha, assada, cozida, em um bom churrasco, é uma ótima opção. Na própria Charcuterie ela tem o seu lugar mas no meu entendimento não é um lugar ao sol é apenas um degrau acima das carnes suínas comerciais, digamos que está no meio do caminho de uma matéria prima que precisamos para a Charcuterie. Então para aquele tiozão do churrasco usar um Duroc beleza pura, mas pra você deixar uma peça maturando por meses e depois descobrir que o problema foi a qualidade da sua matéria prima é querer se fingir de leitão pra mamar deitado. Eles buscaram genéticas do Pietran, Landrace, Lawjuathi, entre outras raças que são produtoras de leitão e você abate com poucos meses e então ficou claro que produzir gordura era inviável e contra o capitalismo, não é tangível na eficiência produtiva até pelo alto custo de ração e gasto energético, quanto mais magro o animal mais produtivo ele é para o mercado o que de certa forma também não foi ruim para produtor/criador.



Embora existam empresas especializadas em raças suínas no Brasil e coloquem o Duroc como uma Carne Prime eu não vejo dessa forma para o uso na Charcuterie, é uma carne suína boa/razoável para um churrasco desde que seja PO (puro de origem), mas para Charcuterie precisamos de mais que isso. Inclusive é uma raça que já vem se consolidando no mercado e volto a dizer não estou dizendo que é carne ruim, é uma bela matriz protéica, mas para Charcuterie deixa a desejar, até porque o Duroc PO (puro de origem) no meu entendimento é questionável até onde ele é realmente PO ou sintético, onde se faz cruzamentos consanguíneos entre parentescos pra chegar numa raça aceitável, além de ter as chamadas heteroses.


Heterose ou vigor híbrido é um fenômeno caracterizado pelo melhoramento ou aumento de qualquer qualidade biológica em uma prole híbrida ou mestiça, ou seja, com pais sem parentesco ou com parentesco muito distante, é como se 1 + 1 fosse um pouco mais que 2, conseguindo melhoras expressivas em características predominantes de algumas raças através da genética líquida.

ree


Por exemplo, a raça Nilo Canastra veio para o Brasil na época das navegações trazida pelos portugueses e espanhóis, é de origem da raça Alentejano de Portugal e da Espanha, na península Ibérica, é uma raça que passa a vida inteira 100% solta, criado solto no pasto, recebendo alimentação balanceada 2 ou 3 vezes ao dia, pra ele poder desenvolver com todos nutrientes que nós queremos, eles pastejam igual o boi de pasto sabe, comem capim, raízes, muitos frutos nativos, a textura da gordura de um animal desse é totalmente diferente de um Duroc por exemplo, é quase liquefeita, sem falar nas gorduras que ele come, são mais insaturadas do que saturadas o que da aquele sabor acastanhado de alta qualidade, costumo dizer que são porcos com Terroir. Ele está em um local especifico com acesso a uma alimentação diferenciada, a própria pastagem, ele vai ter o sabor daquele local, ou seja, tem seu Terroir.


E ai sim com uma matéria prima dessa podemos transformar carne em arte. A presença de gordura é fundamental, tanto de gordura entremeada quando subcutânea e a não presença do gene halotano - reduzimos o risco de perda do trabalho com uma carne PSE, porque o transporte e o abate são muito bem controlados hoje então o nível do stress é baixíssimo, hoje em dias o produtores fazem a tal de genética liquida que é feita com as fêmeas que têm habilidade materna começando na granja dos avôs, ficando mais próximo do ápice genético.


Ai você pode questionar sobre como lidar com risco de consanguinidade na raça do Nilo Canastra que você tá falando tão bem, sim pode existir no começo do plantel, mas depois de um tempo começamos a identificar as fêmeas pra fazer o cruzamento com animais mais puros naturalmente.


GENE HALOTANO - Já que falamos do Nilo Canastra é bom dizer que é uma raça livre do gene halotano que atrapalha muito e causa os defeitos da carne PSE, esse gene é estudado a partir da raça Pietran(raça francesa) que é muito musculosa, os estudiosos dizem que possui quase uma dupla musculatura, confere alta produção de carne e baixa produção de gordura, é um gene muito relacionado ao stress, mas também participa da formação de várias outras raças que são muito presentes na parte industrial, ou seja, as raças que você comprar no mercado carregam esse gene.


O QUE GERA O GENE HALOTANO EM GRANDE PARTE É O STRESS a PSS - Síndrome de estresse porcino - A síndrome de estresse suíno (PSS - do inglês Porcine Stress Syndrome) ou hipertermia maligna suína é uma doença hereditária monogênica recessiva que se caracteriza por uma desordem neuromuscular, com um locus autossómico único, denominado inicialmente gene halotano (HAL) e atualmente chamado gene receptor da ryanodina "RYR1". A carne pálida, macia e exsudativa (PSE - do inglês Pale, Soft and Exudative) resultante da síndrome, ou de outros fatores em carne bovina e de frango, é considerada um defeito. Apesar do termo "macia", ele se refere à carne crua, que perde água durante o cozimento, tornando-se dura e não suculenta.


A suinocultura industrial é muito importante e precisa abastecer os frigoríficos pra manter a segurança alimentar do país no sentido de colocar comida na mesa das famílias, porque quem faz isso em escala não é o artesanal é a indústria, até pelas dimensões geográficas do Brasil que é continental, diferente por exemplo das Itália, que até hoje você encontra famílias criando suínos no quintal de casa.

Então, quais raças podemos usar na Charcuterie?

Nós temos muitas raças que produzem carne e gordura de alta qualidade aqui mesmo no Brasil, por exemplo: Moura, Sorocaba, Piau, Caruncho, Canastra, Pirapetinga e tantas outras, são raças antigas brasileiras, que chegaram com as navegações e são excelentes para Charcuterie, muito melhores que o Duroc.


As raças são divididas em Célticas e Ibéricas, o porco de orelha ibérica tem a orelhinha caidinha, o céltico tem a orelhinha erguida, levantada.


Raça de Porco Moura

Com peso adulto de até 300 quilos, o Porco Moura é uma das maiores raças em tamanho no Brasil. Tem pelagem escura entremeada de pelos claros (chamado também de tordilho ou gris), com um típico padrão “rajado” e uma estrela na testa que lhe dá nome em algumas regiões. Desde o descobrimento do Brasil, os portugueses e espanhois trouxeram diversos porcos de diferentes tipos que foram deixados no país em diferentes regiões, no que tiveram que se adaptar e sobreviver, desenvolvendo-se por séculos, resultando nos animais atuais. Uma das raças de porcos brasileiras que surgiram foi o porco Moura na região do Paraná. A raça é descendente ou aparentada com os famosos porcos pretos ibéricos que são muito utilizados para a produção de presunto cru suíno pata negra, produto altamente valorizado e comercialmente demandado, um dos melhores na sua categoria no mundo. Com a desvalorização de raças do tipo banha ou mista, estes animais nativos ficaram restritos a pequenos produtores rurais. O porco Moura é uma das primeiras raças de suínos brasileiros reconhecidos e se tem trabalhado no sentido de evitar sua extinção e a preservar - sendo que em 2016 era estimado o número de apenas 330 animais puros da raça. Os animais que hoje estão sendo recuperados foram resgatados de pequenos produtores que foram muito importantes para a conservação da raça aos longo de séculos e a sua sobrevivência nos dias atuais. O Moura é a única raça brasileira de origem espanhola, todas as outras são de Portugal.


A raça é de aptidão mista para carne e banha. É criada solta em piquetes no sul do país, mas pode ser criada em pocilgas. Por ter ascendência comum com o porco preto ibérico, a raça tem um bom nível de marmoreio de gordura na carne - qualidade esta superior a raças especializadas na produção de carne - além do que a carne é mais vermelha e com sabor mais marcante, sendo usada para a produção de diversos embutidos com alto valor agregado.Com o crescimento do mercado de produtos mais orgânicos, sustentáveis e com a preocupação pelo bem estar animal ou de produtos mais requintados com sabores diferenciados e produção mais artesanal, cujo sabor é apreciado na alta culinária para receitas mais elaboradas e por clientes de paladar mais exigente, além do aumento das chamadas boutiques de carnes em todo o Brasil, o porco Moura tem qualidades para garantir o próprio espaço neste nicho de negócios. Os animais da raça têm crescimento mais lento comparados a raças mais precoces e produtivas, o que - em tese - aumentaria os custos de produção, por outro lado por ser muito rústica os custos de criação são bastante reduzidos, além do que a qualidade da carne faz diferença permitindo a raça ser competitiva.


Atualmente, com a redução da grande controvérsia a respeito do uso de gordura animal ou de gordura vegetal e suas consequências para a saúde humana que dominou a literatura científica nas últimas décadas, com recentes estudos indicando que a banha de porco não é prejudicial como se supunha antigamente com algumas pesquisas apontando que os óleos vegetais têm características que são prejudiciais a saúde, o mercado de banha de porco vem crescendo novamente aos poucos e raças mistas produtoras de carne e banha, como é o caso do porco Moura, podem voltar a ser economicamente viáveis e importantes.


Nota pessoal

Não estou querendo inviabilizar a nossa arte, você quer produzir seus embutidos com a carne do açougue da esquina, tá tudo bem, mas não perca seu tempo sonhando em produzir embutidos de alta qualidade com isso. Como não dependo de vender conteúdo enlatado para sobreviver, posso dizer a verdade sobre fazer embutidos artesanais de alta qualidade. Não existe bom e barato, o que existe é o ruim e caro. Você consegue fazer um queijo de alta qualidade com leite ruim? Você consegue fazer pão de alta qualidade com farinha ruim ? Você faz vinho de alta qualidade com uva ruim? Por que acha que pode fazer embutidos artesanais de alta qualidade com carne ruim? Não adianta nada você comprar a melhor câmara do mundo, o melhor medidor de pH do mundo, os melhores insumos do mundo, os melhores sais do mundo, os melhores cursos do mundo, o melhor moedor do mundo, e usar tudo isso com a carne do açougue da esquina. Você pode fazer salame em Marte com a tecnologia da NASA se quiser, mas se a matéria-prima não for de qualidade, será um salame feito em Marte de péssima qualidade. Fique atendo com criadores de conteúdo digital gourmetizando a Charcuterie. Observe que antes do descobrimento do Brasil não existiam os animais domesticados, cavalo, galinha, vaca, boi, e também não tinha os porcos. Esses animais chegaram com as expedições do velho mundo em caravelas e embarcações da época, junto com a coroa portuguesa e coroa espanhola pra fazer colonização. E já naquela época o porco se destacava dos outros animais porque além dele ocupar menos espaço ele também aceitava comer os restos, lavagem e muitas vezes até mesmo o lixo durante as expedições.


E assim nasceram as primeiras populações desses animais aqui na America do Sul sendo povoada aos poucos. E mais uma vez volto a dizer que a história da civilização humana está intimamente ligada a esses animais e também a Charcuterie. O porco é um dos melhores conversores de alimento que existe na natureza, principalmente dessas raças nativas e não modificadas. Mas tenha em mente que a conversar alimentar( transformação da alimentação em músculo não pode ser padronizada). É impossível você padronizar os cortes, o peso, os lotes desses animais tipo banha. Até uma determinada idade conseguimos ter uma métrica mas depois as curvas ficam diferentes de forma bem acentuada. Por incrível que possa parecer depende muito do instinto e personalidade de cada animal, um dorme mais o outro come mais, o outro se movimenta mais e assim por diante, consequentemente uns tem mais gordura e outros menos gordura, isso ocorre até mesmo com o porcos ibéricos. Isso sem falar no tipo de manejo (criado solto) ao ar livre, é ainda mais difícil controlar e padronizar. É por isso que eu sempre digo que o sistema intensivo de confinamento da indústria é essencial para nossa segurança alimentar, é a industria que alimenta nossas famílias.


O conceito de porco caipira no Brasil é totalmente errado e descaracterizado culturalmente falando, a carne suína de granja é totalmente sem sabor, sem cor, sem gordura, sem aquelas propriedades organolépticas que precisamos. Mas existe uma evolução no sentido de que hoje você compra as fêmeas reprodutoras e faz todo ciclo dentro da sua propriedade, os animais podem ser criados soltos com uma rede de segurança sanitária, são vermifugados individualmente e tudo mais.


No meu entendimento, é muito mais importante como vive o animal do que a raça dele, porque a raça você melhora com a genética, mas o manejo depende do homem, assim como a importância do solo para criação do porco, representa a mesma complexidade e riqueza do oceano por exemplo, tem seu próprio Terroir, a fauna também é fundamental, não podemos romper a cadeia se vamos deixar os animais expostos a esse manejo, como já expliquei acima, porco que come lixo tem gosto de lixo. Quando se tenta adquirir uma raça dessa é preciso lembrar que estamos no Brasil e temos o a nossa burocracia que inclui, certificados de vacinação, drogas e vacinas administradas no lote, boletim sanitário suíno, inspeção, carregamento, número de lote, georreferenciamento, transporte, ciclo completo, terminador, responsável técnico, veterinário, e mais uma pilha de documentos. E também é preciso investir em um pouco de tecnologia e genética, temperatura, um leitão precisa de uma determinada temperatura e a matriz de uma outra temperatura pra manter o bem estar animal, imagina como fazer isso em uma chácara sem um mínimo de investimento. Digo isso porque vários amigos que fazem Charcutaria Artesanal dizem que sonham em comprar um chácara e construir um chiqueiro, não é bem assim não pessoal. Um exemplo bem simples é você comprar um pote de banha suína no mercado de uma marca qualquer e depois procure uma banha suína de uma raça caipira, é como a água e o vinho.






 
 
 

Posts recentes

Ver tudo

Comentários

Avaliado com 0 de 5 estrelas.
Ainda sem avaliações

Adicione uma avaliação
bottom of page